05/10/2014

E no entretanto?

No entretanto, vão-se passando os dias. Buscam-se alegrias nas coisas mais insignificantes. Procuram-se sorrisos e escondem-se tristezas. Ocupa-se o tempo e a mente. Trocam-se as voltas aos dias e o sentido às noites. Vive-se em (des)compasso de espera. Vive-se nas horas mortas e sobrevive-se no dia-a-dia. Enganamo-nos a nós e ludibriamos o mundo.

No entretanto? No entretanto, inventa-se uma vida. No entretanto, constrói-se uma história. No entretanto, ganham-se memórias. No entretanto, respiramos fundo, levantamos a cabeça e olhamos o mundo de frente. Olhos nos olhos. No entretanto, pensamos, analisamos, concluímos. No entretanto, cheiramos, ouvimos, saboreamos. Crescemos. 

E no entretanto? Vive-se.

*Rita Leston*

Não há espelho que nos tire de nós mesmos

Não há espelho que nos dê a nós como foras, porque não há espelho que nos tire de nós mesmos. Era precisa outra alma, outra colocação do olhar e do pensar. Se eu fosse actor prolongado de cinema, ou gravasse em discos audíveis a minha voz alta, estou certo que do mesmo modo ficaria longe de saber o que sou do lado de lá, pois, queira o que queira, grave-se o que de mim se grave, estou sempre aqui dentro, na quinta de muros altos da minha consciência de mim. 

Bernardo Soares (Fernando Pessoa), in "O Livro do Desassossego".


Era - Misere Mani